quarta-feira, 28 de março de 2012

Acorda, Brasil

Acordou cedo naquela manhã, ainda deitado acompanhou as notícias nos jornais de qualquer canal a cabo. Mesmo cansado de toda a rotina de treinos dos últimos três anos viu pela TV como os cidadãos do seu país estavam eufóricos para o jogo daquela noite. Era o técnico não apenas de uma seleção com potencial, mas sim de uma seleção de torcedores exigentes, com histórico a ser honrado e dona do país, dos campos e de todas as bolas que iriam rolar no próximo mês.

Levantou-se. Era hora de orientar toda a sua equipe e o seus meninos. Teve alguns arrependimentos, algumas decepções e leve desentendimentos com os convocados, mas mesmo assim se fazia de forte e confiante: “Essa taça é nossa, vocês querem dar para esses 200 milhões e tantos mil brasileiros a decepção de ter perdido o troféu em casa”? Repetia exaustivamente treino após treino.

Após o almoço enfrentou o primeiro choque do dia: o ônibus oficial da seleção brasileira estava preso em algum lugar do trânsito. Os noticiários vespertinos alertavam que o trânsito na cidade de São Paulo era recorde para o horário. Todas as vias de acesso para a zona leste e para o estádio de Itaquera estavam congestionadas.

Não se desesperou. Aprendeu com o tempo e com anos de brasilidade que para tudo existe uma solução. Consultou toda a equipe técnica, e ordenou que contratassem seguranças. Iriam para Itaquera de metrô. Pediu para os seus assessores mais influentes não divulgarem nada a imprensa, queria fazer tudo as escondidas para não gerar crise e nem comoção entre o público.

Informou aos jogadores. “Moro na Europa e dirijo um porshe, sou qualificado a fazer gol, e não a pegar condução pública”. Esquivaram-se muitos dos meninos. Sem sáida, ameaçou dizendo que seria isso ou uma substituição. Alertou as estrelas da seleção que havia muito moleque no banco de reserva com vontade. Convencido os jogadores, pediu para que calculassem um horário e saíram com três horas de antecedência do inicio da partida.

Péssimo cálculo! Anotou em sua agenda que precisaria rever os matemáticos da comissão técnica. Só para entrarem na estação levaram quarenta minutos, e mais vinte para embarcarem no trem, e mais uma hora para chegarem ao estádio, e mais quinze para caminharem até os portões de acesso. Conclui que depois disso tudo não precisavam de aquecimento.

No caminho para o vestiário disse olá para o prefeito da cidade, parabenizou a beleza de alguns coqueiros em uma avenida movimentada, ideia de uma amiga da autoridade. Perguntou, por educação, se havia pegado trânsito. Obteve como resposta “Que nada, vim de helicóptero”! Helicóptero, puxa! Como não pensou nisso antes. Submeteu seus craques a viajarem quase duas horas de metrô, mas não pensou em virem voando. Assumiu o erro e entendeu que seu negócio era bola e não infraestrutura.

E já que era entendido de bola, decidiu dar uma olhada na gordinha oficial do torneio, só para ter informações novas para dar aos seus meninos. Perguntou para alguém da Federação Internacional onde ela estava e bang! Mais um tiro: a bola estava nas alturas, E não porque algum goleiro lançou um tiro de meta potente, mas sim, pela impossibilidade da aeronave que a carregava pousar nos aeroportos da cidade. “É uma nova espécie de crise aérea, só decola e pousa quem tem autoridade”.

Foi informado de que jogariam com uma bola de capotão emprestada do clube que gerência o estádio. Tudo bem, menos mal! Conversou mais com os seus meninos, fez todos os rituais oficiais envolvendo de orações e mandingas, puxou o time pelo braço, subiu as escadas e adentrou no... Espera! Onde é que estava o gramado?

Não havia gramado algum! “Como assim não há gramado, os engenheiros me garantiram que até a partida de estreia teríamos grama” reclamou com algum superintendente responsável, mas o que ouviu de resposta foi algo como cronograma atraso e ausência de verba pública. Indignado quis cancelar tudo, tentaram argumentar dizendo que muitos jogadores começaram jogando em campinhos com terra batida bem piores do que o estádio oferecido. Sentiu-se alterado, nervoso, irritado com o despreparo entre outros adjetivos que denominam angústia e raiva.

Gritou alto e acordou suando frio.

Ainda faltavam quase dois anos para a grande noite. No entanto todas as obras estavam encaminhadas para que tudo se tornasse igual ao seu sonho. Estádio, 50% da obra concluída. Expansão do transporte e vias públicas, 40%. Revitalização dos aeroportos, 60%. Refletiu sobre tudo ao ler notícias sobre o andamento das obras e conclui que caso as autoridades não acordassem, como ele havia acordado, não existiria jeitinho brasileiro algum que solucionasse os problemas de grande porte em cima da hora.

Pensou bem e conclui que na pior das hipóteses, se nada estivesse pronto até semanas antes do mundial, iria se afastar da seleção. Alegaria problemas familiares, afinal é sempre uma boa desculpa para ser utilizada quando quer afastar-se de um problema, ou quando se quer largar o barco com classe.

domingo, 11 de março de 2012

[ Sobre livros paraditáticos e o que aprendi com eles ]

Lembro que na sétima série eu li um livro para o colégio. Desses livros bobinhos, com letras grandes, ilustrações e no máximo 120 páginas que temos um prazo de dois meses para ler (oi, eu lia em um dia) e que depois somos obrigados a fazer uma prova a respeito. Era um livro do Walcyr Carraco, chamado "Estrelas Tortas." Tinha uma capa azul com um céu estrelado, e a sombra de uma menina sentada. A história era bobinha, dessas que ensinam lições de não-preconceito e cidadania para jovens sem educação, não o meu caso, claro...

A história falava de Marcela, uma adolescente que do dia para noite perde os movientos e fica paraplégica, o enredo do livro é narrado pelo ponto de vista do irmão dela, Gui, que aparentemente foi a pessoa que mais sofreu com a mudança as quais as pessoas de sua família tiveram que passar para se adaptar a rotina de convívio com uma cadeirante.

Dia desses refletindo sobre a vida me veio a cabeça esse livro. Tentei acha-lo na minha estante entre exemplares de Harry Potters, Dan Browns, Marleys e Eu, mas como a maioria dos livros da época de colégio, ele se foi... Talvez para alguém que precisou e nunca me devolveu, talvez para um sebo em uma das minhas crises de agora só leio romance inglês. Lamentei por não tê-lo mais comigo...

Me lembro que na ocasião da primeira leitura não gostei muito do livro, era bobinho de mais para o que eu estava acostumado a ler. Poré, sempre admirei e achei sucinta e poética a forma como o autor lidava com o assunto. Não ter mais este livro comigo, me fez ver que assim como muita coisa na vida, ele foi embora sem que eu percebesse...

Muitas lembranças, e muita gente entram na nossa vida e vão embora sem que se perceba, a vida somente as leva com o vento. Elas vem, fazem seu trabalho, deixam a sua marca e se vão. Estou meio que em uma fase de perceber que pessoas que eu gosto muito estão indo. Seguindo seu caminho, tentando escrever sua história. Claro que eu também tento trilhar o meu, mas sempre pensei em levat junto quem se faz importante para mim.. Mas nunca havia me tocado que na estrada que muitas pessoas optam por seguir só há espaço para um viajante, ou que sei lá, talvez eu não seja tão importante para muitas pessoas...

Algumas amziades se perderam no caminho, algumas lembranças se apagaram da minha memória, alguns livros sumiram da minha estante. Mas mesmo assim estiveram comigo o tempo necessário para serem inesquecíveis. "Estrelas Tortas" pode não ser (e com certeza nunca será) o melhor livro que li em minha vida, mas será sempre um daqueles que lembrarei com carinho. Não por ter aprendido a respitar os cadeirantes, ou por ter tirado uma nota alta na prova sobre o mesmo. Mas sim pelo seu final. Na verdade por sua última frase:

"Todos nós somos feito um pedaço da noite: de longe estrelas perfeitas, de perto estrelas tortas."

Assim como este livro, muita coisa em minha vida só é legal e só deixa sua marca quando termina...